Por Hélder Oliveira Coelho
Tem dias que acordo com aquela vontade incontrolável de ter nascido um kamikaze dos tempos que correm. Um bombista suicida da Velha Europa. Dos que trazem a sua fé no peito como a única e inquestionável verdade. A fazem cumprir democraticamente à força. Ou se fazem explodir para mostrar como se devem tratar os infiéis!
Claro está que, com o que me pagam, fosse eu um MacGyver e até rebentava qualquer coisa. Como não sou, limito-me a controlar os meus gases de forma a não se dar por eles. O Macgyver seria capaz de construir uma bomba atómica só com base na ingestão de muito feijão, grão, castanha ou couve-galega. Eu, pobre homem, restrinjo-me à social insignificância da minha flatulência, quando não muito mal-cheirosa.
Todavia nem sempre assim foi. Já fui um português com sonhos! Queria ser um terrorista com futuro. A minha paixão pelas Petazetas começou quase no berço. Almejava todo o meu ser numa consumição de estalinhos. Um lampejo hiperestésico parecia fazer-me ver as cores surgirem por entre o som agressivo que soltava na boca. Um fogo-de-artifício pejado de foguetório de lágrimas. Não aqueles pum-puns que só assustam, sem qualquer impacto. Não! Isso não. Todo um universo de emocionantes cores, das que choram e repenicam o estalido. Petazetas dos Céus! Um Afonso Henriques do século XXI.
A adolescência privou-me da maravilha das Petazetas, mas o sonho longínquo de fazer explodir algo sempre me povoou o espírito. Num repente, dou conta de que, lá por fora, há muito que se investia em formação de qualidade. Os petizes são treinados desde muito pequenos para saber como bem explodir. A Velha Europa, como sempre, deixa-se ficar para trás, na hora de fazer sair a bomba. Coisa que não me deveria causar espanto. Com a entrada na idade adulta, finalmente compreendo que a única coisa que posso fazer rebentar é o saldo do meu cartão de crédito. Era o tipo de explosão que até agradava a todos. Era prática comum. Bem vista, bem estimulada. Nada que se compare à bolha gasosa da couve ou da castanha, pese embora houvesse quem sugerisse que o cheiro podia ser o mesmo, na hora em que a bomba rebentasse.
Pois fosse eu hoje uma Petazeta e estaria a estalar num lugar onde me deixassem eclodir à vontade. Longe dos maus cheiros. O sonho lá se foi com o tempo. Quando as bombas deixam sair a explosão de gás mal-cheiroso, eis que surgem as virgens impolutas a garantir que nada de fedentinoso lhes ocupou jamais as entranhas. Mas, não fossem as entranhas podres deste mundo, não cheiraria tão mal.
Fosse eu uma Petazeta e estaria a estalar num lugar onde me deixassem eclodir à vontade!
Um comentário a “Fosse eu uma Petazeta”
[…] do editor: Esta crónica, juntamente com a da semana passada, foram difundidas na rubrica «Teoria da Evolução» da Rádio Altitude em 23 de Novembro de […]